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Conheça a história dos irmãos que, após 15 anos, se reencontraram por acaso no Carnaval de Salvador: 'Deus nos uniu'

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Da redação

Vitor atuava como vendedor ambulante e catador no Carnaval e Joaquim, que atua como educador social, estava no primeiro dia de plantão do Catafolia

Conheça a história dos irmãos que, após 15 anos, se reencontraram por acaso no Carnaval de Salvador: 'Deus nos uniu'
Bruno Concha/Secom PMS

Um abraço longo e emocionado uniu o vendedor ambulante Vitor da Silva, de 42 anos, ao educador social Joaquim Donato dos Santos Júnior, 36, neste Carnaval de Salvador 2024, colocando fim a uma busca que já durava 15 anos. Os dois são irmãos e haviam se encontrado pela última vez em 2009, no enterro do pai deles.

O reencontro ocorreu na manhã de sexta-feira (9), durante o segundo dia de Carnaval de Salvador. Vitor atuava como vendedor ambulante e catador no Carnaval e Joaquim, que atua como educador social, estava no primeiro dia de plantão do Catafolia, base de apoio para catadores montada pela Prefeitura de Salvador.

Vitor resolveu ir à base do Dois de Julho para tomar um café. Ao chegar na base, Vitor ouviu a voz de Joaquim e o abordou. Imediatamente, Joaquim perguntou: “É você? Vitor?”. Ao tempo que Vitor perguntou se era Júnior. Depois disso, os dois se abraçaram por um longo tempo e choraram.

“Eu tive esse privilégio de encontrá-lo depois de 15 anos. O último momento que nos encontramos foi em 2009, no enterro de nosso pai. Foi um momento de tristeza, mas graças a Deus nos reencontramos depois de muita busca minha por ele”, contou Joaquim.

Joaquim e Vitor se viram depois de 15 anos. Foto: Bruno Concha/Secom PMS

O Catafolia, local em que os dois se reencontraram, é uma das duas bases de apoio montadas pela Secretaria de Promoção Social, Combate à Pobreza, Esportes e Lazer para catadores de materiais recicláveis e reutilizáveis. Durante o Carnaval, para cada espaço, são disponibilizadas 400 vagas por dia pela Prefeitura. Na estrutura, os catadores têm acesso a café da manhã, lanche da manhã, almoço e lanche da tarde, além de sanitários químicos e atendimento médico.

“O que está tendo um significado maior na minha vida hoje é, primeiramente Deus e depois a minha família. Ele me reencontrou neste lugar. Eu nunca imaginei que fosse encontrar com ele aqui dentro, uma pessoa que trabalha com outras que vivem nas ruas. Ele tem esse olhar cuidadoso para quem vive na rua e isso é muito importante, pois quem vive na rua também é ser humano”, disse Vitor.

SEPARAÇÃO

A história de Vitor é marcada por muitos altos e baixos. Filho de Joaquim Donato e de Ana Paula Silva, ele foi criado por uma tia, pois a sua mãe morreu após o parto e o pai não quis cuidar do filho, história muito parecida com o enredo da novela Renascer, obra de Benedito Ruy Barbosa que atualmente está tendo um remake. Esse foi um dos traumas que o empurrou para o alcoolismo.

“O meu pai também era alcoólatra, bebia muito. Depois entrou para a igreja e parou, mas Deus levou ele. Eu não tive uma infância muito boa. Por causa do meu problema com o alcoolismo, a minha mãe de criação me colocou para dormir na laje, no relento, me cobrindo com pano de chão. Dormi nas ruas por cinco meses. Mas eu sempre pensei que um dia daria a volta por cima e a minha volta por cima começou há nove anos, quando conheci a minha esposa e hoje mãe da minha filha”, contou.

Joaquim Donato Júnior e Vitor são os únicos filhos vivos de Joaquim. Eles perderam dois irmãos de forma trágica. A irmã Ana Paula morreu atropelada e o irmão Marcos morreu afogado. Vitor chegou a morar um período com Joaquim e o pai, mas devido a uma briga de família, saiu de casa. Após o enterro do pai, os irmãos não se viram mais, e como Vitor não tem redes sociais e nem tinha aparelho celular à época, foi muito difícil o reencontro.

BUSCA

A tentativa de encontrar Vitor, foi um dos aspectos que motivou Joaquim Donato a trabalhar como educador social. Ele entrou no Consultório nas Ruas, um serviço da atenção básica do Sistema Único de Saúde (SUS), e em alguns momentos fez buscas por Vitor nos bairros de Itinga, Sete de Abril e Castelo Branco, mas não o encontrou.  

“Eu fiquei sabendo que ele estava se reunindo com outras pessoas dependentes de álcool no Largo do Caranguejo, em Itinga, no ‘sindicato’, como as pessoas costumam chamar esses grupos aqui em Salvador. Também soube que ele andou um tempo nas ruas e em Centros de Recuperação, por isso fiz essas buscas por esses bairros, mas sem sucesso”, contou.

ENCONTRO

Joaquim está no Serviço Especializado em Abordagem Social (SEAS) da Sempre desde 19 de janeiro, há menos de um mês. “No momento em que eu me candidatei para a vaga, o meu objetivo era trabalhar com a população em situação de rua, na esperança de encontrar o meu irmão. Foi assim, que no meu primeiro plantão do Catafolia, eu o encontrei e quase não acreditei”, contou.

“O momento foi muito emocionante, eu só fiz chorar bastante. O choro foi de felicidade, de alegria. Eu cheguei em casa sem acreditar, estatelado. Falei com a minha mãe, ela também não acreditou, aí mostrei a foto dele e da filha dele, foi aí que ela já pediu para marcar um dia para eles irem na nossa casa”, descreveu Joaquim.

“No momento que eu o encontrei, eu já estava meio sem acreditar, mas como a nossa fé vem de lá de cima, Deus nos uniu de novo e ninguém vai nos separar. E se hoje eu estou tendo a oportunidade de contar a minha história, é graças ao Serviço Social. Ninguém faz esse trabalho, a não as pessoas que trabalham com a atenção social e com o morador de rua. Essa é uma história de superação. Eu já passei fome também e já dormi no relento, eu sei o que é isso, mas Deus colocou vocês aqui para nos ajudar. A função de vocês, incluindo a do meu irmão, é ajudar o povo. A minha vida agora é só agradecer. Eu sou muito grato”, agradeceu Vitor.

Os planos dos irmãos agora são se manter unidos e fortalecidos. “O que eu mais queria era esse encontro e agora Vitor pode ter certeza que eu vou ajudá-lo no que precisar. E a minha sobrinha, que eu nem sabia que tinha, já é o meu xodó”, contou Joaquim, que mora apenas com a mãe e não tem filhos.

CATAFOLIA

Prefeitura, por meio da Sempre, montou duas bases de apoio aos catadores de materiais recicláveis e reutilizáveis próximas aos dois principais circuitos oficiais do Carnaval, uma delas na Escola Municipal Permínio Leite, no Dois de Julho, ponto onde os irmãos se encontraram, e a outra no Centro de Capacitação de Profissionais da Educação Wilson Lins, em Ondina. As bases já ofereceram mais de 14 mil refeições nos cinco primeiros dias de Carnaval.

O local tem estrutura para alimentação, sanitário químico e atendimento médico, entre outros serviços. São 400 vagas disponibilizadas por dia em cada espaço. Cada catador também tem direito a uma camisa com identificação, boné, protetor auricular e luva.

Gerente de abordagem social, Ivana Santos, disse ter se emocionado muito ao ver a história de Joaquim e se sente grata por ter sido, de certa forma, uma ponte para o encontro. “Eu me senti um instrumento por ter ajudado a proporcionar este momento, visto que Joaquim está com a gente há pouco menos de um mês e fui eu que o selecionei na época. Ele fez a prova e eu identifiquei o perfil dele para fazer parte da equipe”, disse.

“Ele foi contratado, recentemente, como parte de um programa da Prefeitura chamado Vida Nova Empregabilidade, que tinha como um dos eixos a ampliação da equipe de abordagem social. Na escolha das equipes para as bases do Catafolia, justamente Joaquim veio parar na base aqui do Dois de Julho. Não tem como não acreditar no universo e no destino. Então, eu me sinto muito feliz em ter proporcionado, de alguma forma, esse reencontro entre eles. É muito gratificante”, acrescentou.

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