A Prefeitura de Cipó, no Semiárido da Bahia, está sendo investigada por supostas irregularidades na oferta da Educação de Jovens e Adultos (EJA) e uso indevido de recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (FUNDEB). Pelo menos três órgãos apuram se a gestão municipal instalou turmas fora dos próprios territórios para aumentar o repasse de recursos federais. O prefeito José Marques dos Reis, o Marquinhos (PSD), se defende.
A denúncia chegou ao Tribunal de Contas dos Municípios da Bahia em abril, apresentada pelo vereador Denis Fonseca Soares de Farias - opositor de Marquinhos -. Hoje, o caso também é acompanhado pelo Tribunal de Contas da União, que já teria reconhecido as irregularidades e pedido providências junto ao Governo Federal, e pelo Ministério Público Federal, que apura eventual prática de improbidade administrativa e falsidade ideológica.
A suposta invasão municipal, admitida pelo conselheiro Nelson Pellegrino, do TCM, estaria funcionando da seguinte forma: turmas da EJA mantidas pela Prefeitura de Cipó estavam funcionando em distritos e povoados de Tucano e Ribeira do Amparo, sem qualquer convênio ou autorização formal.
Em Tucano, a coordenadora municipal da EJA, Calliane Santos da Silva, relatou ter encontrado aulas em residências particulares nos povoados Canoas, Caminho Velho e São Félix, com alunos usando uniformes e materiais da Prefeitura de Cipó. O relatório do Tribunal de Contas teria concluído que “não há respaldo legal para o funcionamento de turmas da rede cipoense em território tucanense”.
Em Ribeira do Amparo, situação semelhante. Durante a apuração, uma professora declarou ter contrato, salário e merenda custeados pela Prefeitura de Cipó, apesar de lecionar em território de Ribeira do Amparo.
Na decisão, Nelson Pellegrino determinou a notificação do prefeito para apresentar defesa e comprovar as informações do Censo Escolar e os valores de repasses recebidos entre 2020 e 2025. O pedido de suspensão imediata dos repasses foi indeferido, mas o TCM considerou a denúncia idônea e merecedora de apuração, autorizando a continuidade da investigação.
QUEDA NO CENSO APÓS FISCALIZAÇÃO
Os dados preliminares do Censo Escolar 2025, de acordo com o denunciante, registram queda de 21,7% nas matrículas da EJA da rede municipal de Cipó, passando de 4.022 alunos em 2024 para 3.149 em 2025. A redução teria ocorrido logo após o TCU reconhecer irregularidades no processo TC-005.049/2025-3 e determinar fiscalização mais rigorosa sobre as informações repassadas pela Prefeitura ao INEP.
O Tribunal de Contas da União julgou procedente a representação que tratava das mesmas irregularidades, reconhecendo a “desproporcionalidade” das matrículas declaradas pela Prefeitura de Cipó no Censo Escolar de 2024. A decisão determinou o envio dos autos ao INEP, à Controladoria-Geral da União (CGU) e ao Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) para verificação dos dados e dos repasses vinculados ao FUNDEB.
De acordo com os documentos anexados ao processo, a gestão municipal teria utilizado um esquema apelidado de “EJA-CASA”, por meio do qual professores contratados por Cipó lecionavam em casas particulares nos municípios vizinhos, com o fornecimento de merenda, transporte e fardamento pagos pela Prefeitura. Esses alunos, ainda segundo a denúncia, eram contabilizados como matrículas da rede municipal de Cipó.
PREFEITURA SE DEFENDE

O Portal do Casé procurou a Prefeitura de Cipó e o prefeito Marquinhos. Por meio de nota, a gestão municipal confirmou que "identificou um número elevado de pessoas acima de 16 anos que estavam fora da escola, o que levou à criação de políticas públicas específicas para garantir o direito ao acesso e à permanência na educação". De acordo com o executivo, a oferta descentralizada chegou até áreas de divisa com outros municípios.
"A gestão reforça que o atendimento da EJA é flexível, humanizado e adequado ao perfil do estudante adulto, incluindo apoio socioeducativo, metodologias contextualizadas e incentivo à continuidade dos estudos. Como resultado, muitos desses alunos já concluíram o Ensino Fundamental e hoje estão matriculados na Rede Estadual. Outros, por motivos pessoais, acabam por evadir, o que é uma realidade nacional na modalidade", pontuou.
Marquinhos foi na mesma linha. Informou ao Portal do Casé que, desde o início de sua gestão, em 2021, tem se preocupado com o EJA. "Houve essa denúncia, do vereador. Minha equipe acompanhou a fiscalização, sem problema. Quando assumi a Prefeitura tinham 200 alunos no EJA. Hoje, são pouco mais de 3 mil", pontuou.
Questionado se a Prefeitura de Cipó "invadia" territórios de Ribeira do Amparo e Tucano, Marquinhos exemplificou: "Eu, por exemplo, moro na região conhecida como Itapicuru. Na divisa de municípios, existem pessoas que fazem tudo em Cipó. Na questão da educação, envolvendo o EJA, nós temos os polos descentralizados", sustentou.
VEJA A NOTA DA PREFEITURA, NA ÍNTEGRA
A Educação de Jovens e Adultos (EJA) em Cipó passou por um avanço expressivo a partir de 2022, especialmente após o retorno das aulas presenciais no pós-pandemia. Através da Busca Ativa, o município identificou um número elevado de pessoas acima de 16 anos que estavam fora da escola, o que levou à criação de políticas públicas específicas para garantir o direito ao acesso e à permanência na educação.
A modalidade foi estruturada com o princípio de levar a escola até o aluno, com oferta descentralizada para atender, inclusive, regiões de divisa territorial. Em áreas onde municípios vizinhos não ofertavam a modalidade com proximidade territorial, moradores residentes no entorno — mas sem atendimento em suas cidades — acabaram sendo contemplados pelas salas mais próximas instaladas em Cipó.
A gestão reforça que o atendimento da EJA é flexível, humanizado e adequado ao perfil do estudante adulto, incluindo apoio socioeducativo, metodologias contextualizadas e incentivo à continuidade dos estudos. Como resultado, muitos desses alunos já concluíram o Ensino Fundamental e hoje estão matriculados na Rede Estadual. Outros, por motivos pessoais, acabam por evadir, o que é uma realidade nacional na modalidade.
Importante destacar que os dados referentes à EJA são enviados regularmente aos órgãos de controle e seguem os parâmetros estabelecidos pelo MEC/INEP. O município permanece à disposição dos órgãos fiscalizadores e da imprensa para prestar esclarecimentos sempre que necessário.