De frente para o mar da Ponta de Humaitá, em Salvador, funciona o Hospital Mont Serrat, o primeiro — e até agora único — hospital 100% dedicado aos cuidados paliativos dentro do Sistema Único de Saúde (SUS). A unidade ocupa o casarão histórico onde antes funcionava o Hospital Couto Maia, especializado em infectologia.
Sem pronto-socorro ou UTI, o Mont Serrat acolhe pacientes com doenças graves e expectativa de vida limitada, oferecendo dignidade, conforto e acolhimento nos momentos finais. “O foco aqui não é a morte, é o cuidado enquanto há vida”, afirma Karoline Apolônia, coordenadora do Núcleo de Cuidados Paliativos da Secretaria de Saúde da Bahia.
Com 64 leitos distribuídos em quatro pavilhões, o hospital também inova ao incluir, no centro da estrutura, a “Sala da Saudade”, um espaço aconchegante onde familiares se despedem dos entes queridos. Ao lado, o necrotério se integra de forma humanizada ao ambiente.
Entre os pacientes está Ayrton dos Santos Pinheiro, 90 anos, que reviveu memórias ao descobrir que o hospital ficava em um local marcante de sua vida. “Quando cheguei aqui, minhas forças se renovaram”, contou o ex-guia turístico e corredor, hoje em cuidados paliativos após diagnóstico de câncer de próstata.
No Mont Serrat, cada detalhe reforça a proposta de humanização. Desde a triagem até a internação, familiares são incluídos nas decisões, com respeito e empatia. “Perguntaram que música meu pai gosta, se queria fazer a barba… Isso nos deu paz”, relatou Ayrton Júnior, filho do paciente.
Os critérios para internação exigem diagnóstico grave e expectativa de vida de até seis meses. Alguns pacientes, no entanto, se recuperam e recebem alta, podendo voltar ao convívio familiar. “Eles se reconectam com o que é sagrado para muitos: a própria casa e a família”, explica a médica Yanne Amorim.
O hospital é fruto de um projeto iniciado em 2019 e hoje é referência nacional, especialmente após o Ministério da Saúde lançar, em 2024, sua primeira política pública voltada para cuidados paliativos. Com média de internação de oito dias, o Mont Serrat propõe um novo modelo de cuidado no SUS — centrado não em prolongar a vida a qualquer custo, mas em garantir dignidade até o fim.