A primeira cirurgia genital afirmativa de gênero, ou de redesignação sexual, pelo Sistema Único de Saúde (SUS) aconteceu na Bahia, na quarta-feira (9), no Hospital Universitário Professor Edgar Santos (Hupes), em Salvador. Ela foi realizada pelo médico professor da Ufba e coordenador do setor de cirurgia reconstrutora urológica e pediátrica da unidade, Ubirajara Barroso Jr. O procedimento durou sete horas e transformou, oficialmente, uma mulher trans (aquela que não se identifica com o sexo que nasceu) em uma mulher.
A paciente tem 47 anos. “Durante a visita ela demonstrou muita satisfação. Já está andando e se alimentando. Retiraremos a sonda e o tampão vaginal”, avaliou Barroso.
A partir daí, a mulher deve iniciar o processo de dilatações periódicas do canal vaginal para não fechar. Dentro de dois meses estará apta a iniciar a nova vida sexual penetrativa. O canal vaginal é construído através da pele do órgão genital masculino, que é removido.
“Fazemos um canal invertendo para dentro a pele do pênis por meio de uma abertura entre o reto e a bexiga. Já a glande, tiramos uma parte e fazemos um formato de clitóris, preservando vasos e nervos garantindo em pelo menos 70% dos que se submetem a esse processo, a sensibilidade e o orgasmo”, explicou.
Desde 2008, o SUS oferta procedimentos ambulatoriais e cirurgias para pacientes que desejem fazer a redesignação sexual. Mas, na Bahia, o programa começou efetivamente os atendimentos na semana passada. Através de uma parceria com o Governo do Estado, o Hospital Universitário Professor Edgar Santos passará a ofertar o serviço uma vez por mês, na unidade.
A CIRURGIA DO HOMEM TRANS
No caso de um homem trans (aquele que possui órgão genital feminino), o procedimento é um pouco mais complexo. Pode ser realizado de duas formas: metoidioplastia e faloplastia. A metoidioplastia preserva todo o clitóris e o transforma em falo. Isso garante uma maior sensibilidade na hora da relação sexual. No entanto, o tamanho pode não chegar ao desejado.
No Hupes, a equipe faz uso da técnica TCM (Total Corporal Mobilization ou Mobilização Total dos Corpos Cavernosos), que maximiza os benefícios da cirurgia. “Separamos a parte interna dos corpos cavernosos que está imersa no períneo, colada ao osso da bacia. Isso facilita a confecção de um falo de maior. Mas varia muito. Pode chegar a, no máximo, 9 cm”, afirma Barroso. Atualmente, esse é o procedimento mais comum realizado no Brasil.
A faloplastia garante um tamanho maior do falo, mas não há ereção. Nele, podem ser usados tecidos de antebraço, pele abdominal, perna, ou outros. Para quem deseja realizar penetração é necessário usar uma prótese peniana. Nesse caso um escroto é construído e dentro dele uma bomba é implantada para fazer a prótese inflar.
“Apesar da sensibilidade ser menor, é possível ter sensação orgasmática. Mas, obviamente, não é a mesma de ter um pênis. Por isso, muitos optam pela reconstrução, mesmo que fique menor”, constatou o médico.
QUEM PODE FAZER A REDESIGNAÇÃO SEXUAL?
Para iniciar o processo é necessário ser maior de 18 anos. Para realizar a cirurgia genital afirmativa de gênero também é necessária vivência com o nome social. O procedimento pode pode incluir tanto a construção de um novo órgão genital, quanto a remoção de órgãos como testículos, mama, útero e ovários. Isso depende da decisão particular de cada um.
SERVIÇO DO HUPES
O Hupes conta com um ambulatório especificamente voltado para a população trans. Nele, pessoas interessadas em fazer a transição de gênero recebem acompanhamento social e psicológico.
A unidade segue alguns critérios para realizar a cirurgia. São eles:
- Fazer acompanhamento endocrinológico regular nos ambulatórios HUPES ou CEDAP;
- Fazer acompanhamento psicológico por no mínimo 2 anos com liberação pela equipe de psicologia;
- Ter liberação do serviço social (acompanhantes e estrutura no pós- operatório)
- Idade (mais velhos primeiro) - apenas maiores de 18 anos;
-Tempo de acompanhamento no serviço;
-Hormonização há pelo menos um ano;
Os interessados devem procurar o HUPES pra agendar consulta no serviço. A marcação é feita no guichê do prédio Magalhães Neto (complexo HUPES) nos dias úteis, das 13h às 19h.
O primeiro atendimento é realizado por uma enfermeira da unidade e, na sequência, o paciente é encaminhado para um endocrinologista ou para a equipe de psicologia. O endocrinologista é responsável por prescrever a terapia hormonal que ajudará no processo. Já o psicólogo emite o laudo exigido pela portaria do Ministério da Saúde informando se o paciente está ou não apto para a transição. Os atendimentos acontecem às sextas-feiras à tarde.