A revista diz: se vista pra você, abra um vinho e curta sua própria companhia, se embeleze para o seu amor próprio. Você não precisa do outro. Quanta balela. Pra começar, o vinho é uma bebida para compartilhar com o amor, ou com a amizade, que nada mais é do que outra forma de amor.
Se enfeite pra ficar bonito e encantar o olhar alheio, mesmo que não encante. Saia sonhando em encontrar o amor na primeira esquina, mesmo que não encontre. Deseje viver uma grande e deliciosa história de amor, mesmo que, por ventura, não viva.
Viver é experienciar o amor. Não tem escapatória, mesmo que você evite, corra, não queira, ele te pega em algum momento. E aí toda a roupa, maquiagem, exercício, conhecimento vai se justificar.
É pra isso que nos abastecemos de cultura, de delicadezas, de beleza. Não para ficar em uma fria casa, bebendo vinho solitário dia após dia até a tristeza e a melancolia se apossarem, até porque este momento é inócuo. Não vai preencher seus desejos necessários e mais íntimos.
Estamos na cultura da individualidade. Se ame. Se cuide. Se deseje. Você se basta. Se basta pra quê? Pra um dia sentir seu coração ir murchando aos poucos porque nunca foi preenchido por um sentimento que faça transbordar todo o investimento em si mesmo?
O bom é ouvir Lupicínio, Gil, Bethânia, Piaf, ler Shakespeare, Vargas Llosa. Ame. Se entregue. Chore. Sofra se for preciso, mas não lamente o entregar-se. Depois a gente levanta e dá a volta por cima, ou pelo menos tenta.
E ama de novo, e de novo, e de novo. As cicatrizes de amor são tatuagens da alma. É lindo exibi-las. É como se a gente dissesse: eu fui, eu vivi, eu amei, eu estive aqui, eu respeitei os desejos do meu corpo e me entreguei ao que há de mais sublime sobre a Terra. E seguirei eternamente à cata da felicidade compartilhada, mas não somente comigo mesmo.
A filosofia do eu, somente eu, nada além de mim, é pífia, escrota e mercadológica. Se é pra gastar, vamos investir direito. Troca de leitura, larga essa mídia que te faz acreditar que será feliz abandonado por opção.
...'vem, por favor não evites meu amor, meus conselhos, minha dor, meus apelos, vou te envolver nos cabelos, vem perder-te em meus braços, pelo amor de Deus'...e viva Chico Buarque, o mestre dos mestres.
