Quatro prédios de um bairro periférico desabam deixando inúmeras vítimas. Não vai dar em nada.
Chuva alaga região do subúrbio de cidade grande, cosmopolita. Não vai dar em nada.
Mãe e filho pretos são assassinados em frente a um bar de uma região pobre da cidade. Não vai dar em nada.
Carro atropela idoso favelado. Não vai dar em nada.
Político com sobrenome de político desde o tempo das caravelas desvia dinheiro da merenda escolar. Não vai dar em nada.
Rachaduras imensas ameaçam vida de moradores de região abandonada pelo poder público. Não vai dar em nada.
Água das marés sobe e destrói casas de pescadores em destino turístico. Não vai dar em nada.
Menino é estuprado por clérigos poderosos. Não vai dar em nada.
De forma indecente, servidores públicos bem remunerados aumentam, na surdina, os salários em níveis 15 vezes maior do que o da inflação. Não vai dar em nada.
Espigões são construídos em beira de praia ameaçando o sol na areia. Não vai dar em nada.
Mulher branca e rica destrata funcionários pretos e pobres em espaço gourmet. Não vai dar em nada.
Mas nem tudo é tão desanimador assim...há sempre os humanos mais humanos.
Mulher de bairro nobre é assaltada na porta de casa. Polícia age imediatamente e captura o infrator, que vai preso e pega pena de morte.
Água invade prédio de alto luxo e alaga a garagem. Todos os moradores são indenizados e ressarcidos com novos veículos.
Artista hétero top, branco e cis, assedia sexualmente uma mulher negra, é processado, condenado, paga irrisória quantia pela soltura e segue lotando estádios.
Isso aqui, ô ô, é um pouquinho de Brasil, iá iá...
Eugênio Afonso.
