Preciso falar disso. Preciso falar sobre esta música de Frejat. Preciso falar sobre a homofobia internalizada em todos nós. E também sobre machismo. Preciso falar...
O nosso ex-Barão compôs Segredos, canção pra lá de batida em tudo quanto é canto. Desde que a ouvi pela primeira vez, me deu um certo 'incomodamento'. Ouvi, reouvi, li e reli a letra e era isso mesmo. Eu não estava enganado. Você pode até estar pensando que não conhece a música, mas conhece sim...vou te dar a dica.
'Eu procuro um amor que ainda não encontrei, diferente de todos que amei... pode ser que eu a encontre numa fila de cinema, numa esquina ou numa mesa de bar...'
Como assim, pode ser que eu a encontre? O amor é masculino, até segunda ordem, e o correto seria 'que eu o encontre', né? Afinal ele está procurando O amor.
E tem mais. 'Procuro um amor que seja bom pra mim, vou procurar, eu vou até o fim. E eu vou tratá-la bem pra que ela não tenha medo quando começar a conhecer os meus segredos...'
De novo dá ao amor um gênero que não é dele. Fica nítido que Frejat temeu parecer homossexual, caso tratasse o amor de forma masculina...'pode ser que eu O encontre numa fila de cinema, numa esquina ou numa mesa de bar'.
Quando, na verdade, ele estaria somente encontrando O amor que tanto procura, não importa de que gênero. 'E eu vou tratá-lO bem pra que elE não tenha medo quando começar a conhecer os meus segredos'.
Porque logo no início da canção, Frejat não disse 'diferente de todAs que amei'?. Simples. Porque ele estava concordando gramaticalmente com a palavra masculina amor, mas a partir do momento em que o amor toma forma humana, ele decide subverter as regras.
Tratando o amor como um substantivo masculino - que é o que ele é -, poderia parecer, segundo sua própria ideia de virilidade, que ele estaria procurando um homem. Então, para não dar margem a dúvidas sobre sua heterossexualidade optou por assassinar o português. Viado, eu? Nem pensar.
Poderia até existir uma tentativa irreverente na letra da canção em transformar o amor em algo não binário, fluido, mas, definitivamente, não é o caso aqui.
O autor compôs uma música romântica em que fala de alguém que está em busca de um grande amor, mas este amor, para ele, precisa ser uma mulher. Não pode haver rastro pra dúvidas.
O amor segue sendo masculino, goste o compositor ou não. E isto não impede que possamos buscar O amor em corações femininos sem que seja necessário dar-lhe um novo e inadequado gênero.
Pode ser que você O encontre em uma fila de cinema e ele seja uma encantadora mulher. Pode sim. Só não é necessário, para encontrar esse tão desejado amor, inverter os gêneros gramaticais por temer uma suposta homossexualidade.
Tá com medo de quê?