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Direito à vida

Data:
Eugenio Afonso

O ser humano é digno de lástima, já sacramentou Strindberg. E eu ando querendo concordar com ele, apesar de ainda preferir gente a bicho

Direito à vida
Arquivo Pessoal

Tem dias em que o desânimo me acomete de forma brutal. Brutal. Não o estimulo, mas também não o temo. Consigo entendê-lo. Só é preciso ficar atento aos sinais depressivos.

Sou melancólico por natureza e desconfio dos que acordam cantarolando e dando bom dia à parede e ao astro-rei. É preciso espreguiçar primeiro, respirar fundo e vestir o escafandro para mergulhar nas águas – mornas, frias, ácidas ou limpas – daquele amanhecer.

Ainda tem o dia em que o corpo não obedece ao desejo. Você jura que consegue, mas as ramificações garantem que não. Aí dói a alma, magoa a autoestima, fere a sensibilidade. A prostração teima em se instalar.

Há também os dias em que o esforço para se manter lúcido é puxado, ainda mais se as costumeiras notícias desastrosas começarem a te cutucar ainda na cama. É um tsunami de decepções humanas.

O ser humano é digno de lástima, já sacramentou Strindberg. E eu ando querendo concordar com ele, apesar de ainda preferir gente a bicho. Porque já tem quem chutou o pau da barraca há muito e optou pelos animais.

Mas, apesar das vicissitudes, a disposição e o bom-humor também me assaltam com constância e, como diz uma atriz famosa que tem uma história trágica de família, eu optei pela alegria.

E o que salva qualquer humano do tédio de uma vida modorrenta é a arte. Para mim, isto é lei. Teatro, cinema, literatura, dança, exposição. Tudo consumido languidamente e em diversas doses.

Um espaço artístico, como um teatro, é um templo para os agnósticos de plantão. Impossível sair indiferente, impossível não se emocionar, impossível não crer no amor, impossível não ficar triste, impossível não sair desanimado, desacreditado...impossível não se tornar mais humano.  

E só para os incautos de plantão, isto aqui não é um texto de autoajuda (argh!). Cada um sabe onde mora sua dor. Como sobreviver a ela? Esta talvez seja uma pergunta de milhões. E a resposta, obviamente, está distante anos-luz de soluções arrotadas aos quatro cantos pelos terapeutas de almanaque.

Uma dica? Olha pra dentro.


 

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