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O TCA e suas noites quentes

Data:
Casemiro Neto

Era um tempo bem diferente de hoje...

O TCA e suas noites quentes
Na imagem, Paulino Silva; Alberto Luciano; eu; Fábio Marconi; e Júlio César Almeida

Um dos principais templos da cultura brasileira pegou fogo em 1958, cinco dias antes de ser inaugurado. Nove anos depois, o Teatro Castro Alves foi finalmente aberto ao público. Durante os anos 80, o TCA ficou em péssimas condições. Mesmo assim, muitos shows eram apresentados. Me lembro que sentávamos nas laterais e no corredor principal, entre as filas, com poltronas quebradas, para assistir a espetáculos de artistas de todo o país.

Era um tempo bem diferente de hoje. Naqueles verões de Salvador, os nomes que movimentavam a cena cultural vinham basicamente da MPB: Caetano, Alceu, Elba, Nara, Gil Gal, Bethânia e Marina sempre estavam na pauta do TCA. Era frequente e comum encontrar esses artistas na praia do Porto da Barra, na parte direita da areia, onde a chamada "galera alternativa", a “malucada”, se reunia, fumava caretas, afins, ou não.

Um dos momentos esperados era a chegada de Caetano. Ele aparecia no começo da tarde. Muitas vezes, vestido de roupão com estampas orientais, pulava das pedras, em frente ao painel de azulejos em homenagem a Tomé de Souza, para as areias do Porto. Marina, ainda encaracolada e sem Lima no nome, conversava com Elba, de biquíni laranja, que dividia o cigarro com uma Zizi Possi, que sorria e cantava com Gil.

De dia, praia. De noite, festa com bebidas, frutas na mesa e o último disco de Rita Lee tocando. Nos shows e peças, Castro Alves no destino.

No início dos anos 90, o então governador ACM decidiu fazer uma grande reforma no teatro. O espaço estava em ruínas e fechado. Tudo pronto, foi marcada a data da reinauguração com um show de João Gilberto, Gal e Bethânia.

Na noite de 22 de julho de 93, um público formado por convidados daqui e de outros estados, em traje de Gala, teve o privilégio de assistir ao espetáculo que pela primeira vez (e acho que única) reunia três dos melhores e maiores artistas do Brasil. No início, eles cantaram separados e depois juntos para encerrar a noite. Na estreia, a fila para autoridades, na segunda parte da plateia, era comandada por ACM, ao lado de todo o secretariado, deputados, autoridades e empresários de todo o país.

Depois da apresentação da Orquestra Sinfônica da Bahia, com destaque para a execução do hino ao Senhor do Bonfim, Maria Bethânia entrou no palco cantando "Emoções”, de Roberto Carlos. Uma cena que chamou a atenção foi quando ela cantou “A Bahia te Espera”, de Herivelto Martins (A Bahia da magia, dos feitiços e da fé). ACM, que adorava Bethânia, se levantou, começou a dançar e puxar aplausos. Foi seguido por muitos.

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Encerrando o show, os três cantaram juntos clássicos da bossa nova e da MPB. Na "Oração de Mãe Menininha", de Caymmi, o refrão da saudação de Oxum "Ora iê iê Ô" com João Gilberto soou diferente e aparentou uma certa ironia no tom. Gal e Bethânia ficaram bem constrangidas. Foi realmente uma noite especial que trouxe de volta incentivos para a cultura local e nacional. Parece que o TCA é chegado a um fogo também fora do palco e das coxias. 

Como se sabe, um novo incêndio fechou o teatro desde Janeiro de 2023. A reabertura está marcada para 2025. Nos resta torcer para não demorar tanto como a última reforma. E que o show de mais uma reinauguração seja inesquecível e antológico como aquele.

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